Romance e orçamento

por Jackie Marins

Talvez eu seja mesmo o último romântico nos litorais desse Oceano Atlântico, como canta Lulu.

Uma leitora-amiga, na semana passada, me falou do romantismo com que esses escritos descrevem e tecem os comentários técnicos sobre a prática legislativa.

Mas, uma pitada de romance sempre torna a crueza da vida um tanto mais doce, palatável e possível de ser vivida.

Garrincha em suas pernas tortas, com seus dribles geniais e Zico finalizando as jogadas com seus chutes certeiros faziam verdadeiras pinturas no pano verde dos gramados, para muito além das jogadas dos cartolas do futebol.

O colorido dos jardins de Monet, que trazem a tardinha para dentro das retinas, são portais mágicos que se abrem para a sensibilidade dos admiradores.

Os sons que nos transportam para vivências tão especiais que ganharam a eternidade em nossa memória, são caminhos conectivos por entre as brumas do tempo.

São nossas escolhas que definem em que quarto secreto serão depositadas nossas vivências… no escuro das dores ou sob os holofotes dos amores eternos ou dos divertidos de carnaval.

Temos a concretude e os rumos certos e duros das regras, dos ritos e dos protocolos do processo legislativo. Mas, temos também os sonhos que animaram as ideias tornadas leis para dar solução a problemas vividos na e pela nossa sociedade.

Possivelmente, foram acalentados por tempos na vida de parlamentares que se elegeram para dar conta dessas promessas feitas a si mesmos, para muito além do tempo de barbárie e horrores que, por vezes, assolam a história da humanidade e contaminam tudo ao redor.

Temos a letra fria da lei, mas temos a alma que a anima. Temos os choques e embates da disputa de interesses, às vezes, não tão republicanos; mas temos também as disputas de ideais defendidos pela vida toda.

Bem, estamos em recesso parlamentar. Momento de pausa.

Nesse tempo, cada representante deve retornar o foco para sua base parlamentar, dando conta do que realizou durante o semestre encerrado e coletando novas demandas para as próximas sessões.

O segundo semestre de cada ano, em especial, é de grande relevância porque se dá a apreciação do projeto de lei que trata da LOA (Lei de Orçamento Anual), e a oportunidade de prever no orçamento subsequente os recursos necessários para a realização dos projetos e programas de interesse de seus municípios.

A LOA é parte do sistema orçamentário, composto também pelo PPA (Plano Plurianual), e a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), que se encerra com a prestação de contas feita anualmente pelos poderes do estado.

O processo legislativo destinado à apreciação do orçamento é especial e conta com tramitação diferenciada, sendo analisado apenas pela Comissão de Orçamento, Finanças, Fiscalização Financeira e Controle, órgão competente para emitir parecer prévio sobre a proposta e para receber as emendas dos parlamentares e emitir o parecer sobre elas; após o que, é apreciado e aprovado pelo Plenário.

O Plano Plurianual, nos termos da constituição da República, artigo 165, é um instrumento de planejamento governamental destinado a apresentar diretrizes, objetivos e metas da administração pública, organizado em programas e estruturado em ações, com duração de 4 anos, com início no segundo ano do mandato do Chefe do Poder Executivo e fim no primeiro ano do mandato seguinte.

Esse planejamento destina-se a apresentar para a população a forma como os bens e serviços serão fornecidos; devendo contar, em detalhes, os atributos das políticas públicas: metas físicas e financeira, público-alvo, produtos a serem entregues, entre outros.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias é apresentada no primeiro semestre de cada ano e traz as metas e prioridades da administração pública que deverão orientar a elaboração da LOA, que estima a receita e fixa as despesas que serão executadas no exercício seguinte e é apresentada no segundo semestre.

Já a prestação de contas, apresentada a cada ano no primeiro semestre, deve apresentar o que foi executado do orçamento previsto no ano anterior, apreciado com o auxílio do Tribunal de Contas, que encaminha à Alerj o parecer prévio.

A função fiscalizatória do parlamento tem previsão constitucional (artigo 122) e abrange os aspectos contábil, financeiro, orçamentário e patrimonial do estado e das entidades da administração direta e indireta, no que diz respeito à legalidade, à legitimidade e a economicidade da aplicação das receitas.

No Brasil, o orçamento tem caráter impositivo e, nos termos constitucionais e com base na jurisprudência, a administração tem o dever de executar o orçamento programado, garantindo a efetivação de bens e serviços.

Em nível municipal, há também iniciativas de elaboração do orçamento que levam em conta a maior participação possível da sociedade. É o orçamento participativo, considerado um mecanismo de efetivação da democracia participativa que permite aos cidadãos influenciar a decisão sobre a utilização dos recursos públicos, de acordo com os assuntos locais que constituem prioridades.

O processo de elaboração do orçamento participativo inclui a realização de reuniões preparatórias em que são apresentadas as contas do exercício anterior e um plano de investimentos e serviços para o ano seguinte.

De acordo com o Ipea, o Brasil é referência internacional em inovação nos métodos de participação, tendo como carro chefe o orçamento participativo, iniciado na década de 1980, com a adoção desse modelo pela prefeitura de Porto Alegre, em 1989. E, atualmente, já está implantado em mais de 1.000 municípios brasileiros, representado a abrangência de aproximadamente 30% da população brasileira.

A maior vantagem deste modelo é a transparência e a possibilidade do exercício consciente e direto do poder decisório, que acaba por exigir uma modernização administrativa.

O maior entrave para sua aplicação é a exigência de maior organização social que viabilize e facilite a participação e o comprometimento político dos prefeitos e lideranças políticas, além da equipe técnica.

A função precípua do orçamento público é a manutenção do equilíbrio entre as receitas estimadas e os gastos previstos, além de ser uma ferramenta que permite ao poder público promover crescimento socioeconômico, aumentando a eficiência e a eficácia dos programas estabelecidos, com os respectivos mecanismos de avaliação e fiscalização dos gastos.

As discussões sobre o uso dos recursos públicos quando ampliadas para a sociedade através do orçamento participativo tendem a estar em maior consonância com as necessidades daquela sociedade, possibilitando o atendimento das demandas prioritárias que são apontadas pelos participantes.

E seguimos pensando no melhor estilo Titãs… “eu só quero saber do que pode dar certo. Não tenho tempo a perder”. Ainda mais se pensarmos que dinheiro público é compromisso com o direito de todos os contribuintes.

Jackeline Marins é Mestranda em Políticas Sociais, na Universidade Federal Fluminense (UFF), Pedagoga, especialista em Administração Pública, pela FGV-Rio, Especialista do Legislativo estadual e a colaboradora do BAIXADA POLÍTICA aos sábados.

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