Por Isabelle Brenda
O Sambódromo da Marquês de Sapucaí, projeto que foi desenhado pelo arquiteto e urbanista Oscar Niemeyer em 1983, abriga os desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro há 40 anos. De lá pra cá, diversas modificações foram feitas até chegar na passarela do samba que conhecemos hoje.
As escolas Grande Rio e Beija-Flor de Nilópolis já desfilaram diversas vezes na Sapucaí e muitos desses desfiles foram icônicos. Vamos conhecer a história dessas escolas e relembrar alguns momentos históricos?
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Vamos começar do início: conheça as origens da Grande Rio
A cidade de Duque de Caxias era carente de uma grande escola de samba, por sorte, o sambista Mílton Perácio tratava a fundação de uma escola como projeto de vida. No município havia agremiações menores – a Cartolinha de Caxias, o Capricho do Centenário, a Unidos da Vila São Luiz e a União do Centenário – que recebiam subvenção da Associação das Escolas de Samba do Rio para se apresentar.
Essas agremiações eram modestas e pequenas, até que Perácio articulou a fusão das quatro numa só: a Grande Rio, ainda sem o “acadêmicos” no nome, ganhou como cores o verde, vermelho e branco inspirados no Fluminense, time do coração de seu fundador.
Os primeiros desfiles foram modestos e o presidente tinha em mente que, para se destacar neste meio, as apresentações precisavam ser mais estruturadas. Então, em março de 1988, Perácio funda a escola de samba Acadêmicos de Duque de Caxias, mas seis meses depois, no dia 22 de setembro, convenceu alguns amigos – Jayder Soares e Helinho de Oliveira – a apostar numa outra fusão, na qual surgiu a escola de samba Acadêmicos do Grande Rio.
Duque de Caxias agora teria uma escola que pudesse se orgulhar, o povo caxiense ganhou autoestima e empoderamento, como define o próprio Perácio.
Desfiles de 2006 e 2010: Grande Rio bate na trave!
Em 2006 a Vila Isabel conquistou seu segundo título de campeã do carnaval carioca com um desfile que celebrava a latinidade. A Grande Rio somou os mesmos 397 pontos que a Vila, mas ficou com o vice-campeonato após o desempate no quesito samba-enredo. Naquele ano, o enredo foi “Amazonas, o eldorado é aqui” do carnavalesco Roberto Szaniecki. O título escapou por pouco!
A história se repetiu em 2010 quando a Grande Rio bateu novamente na trave. Naquele ano, a Unidos da Tijuca conquistou seu segundo título de campeã com o enredo “É Segredo!”, desenvolvido pelo carnavalesco Paulo Barros, quebrando um jejum de 74 anos sem vitória na elite do carnaval carioca. A Grande Rio em 2010 fez uma homenagem aos desfiles e personalidades que marcaram a história do Sambódromo com o enredo “Das Arquibancadas ao Camarote N.º 1. Um “Grande Rio” de Emoção na Apoteose do Seu Coração!” do carnavalesco Cahê Rodrigues e, por apenas 5 décimos de diferença, não levou o título.
Carnaval 2020
Em 2020 a grande campeã do carnaval carioca foi a escola de Niterói, Unidos do Viradouro, com o enredo “Viradouro de Alma Lavada”, desenvolvido pelo casal Marcus Ferreira e Tarcisio Zanon. Em um carnaval marcado pelo corte de verbas das escolas que desfilavam no sambódromo da cidade do Rio de Janeiro, novamente a Grande Rio somou a mesma pontuação final que a campeã, mas perdeu nos critérios de desempate.
Naquele ano, a Grande Rio homenageou o babalorixá baiano Joãozinho da Gomeia com o enredo “Tata Londirá – O Canto do Caboclo no Quilombo de Caxias”, dos carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora. Apesar do desfile espetacular, a escola teve problemas durante a apresentação e perdeu pontos no quesito Evolução, justamente o que foi utilizado como desempate.
Carnaval 2022: Grande Rio conquista do título de Campeã do Carnaval Carioca pela primeira vez
Após 35 anos de história e diversas bolas na trave, a Grande Rio conquistou seu primeiro título no Grupo Especial. O enredo “Fala, Majeté! Sete Chaves de Exu” falava sobre Exu e foi assinado pelos carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora.
O enredo foi muito importante, pois, entre muitos aspectos, desconstruiu os estereótipos negativos que eram atribuídos pelo racismo religioso à divindade Exu. Segundo Arlindinho Cruz, um dos autores do samba enredo, Caxias é o lugar do Rio de Janeiro com maior número de terreiros de Candomblé e de Umbanda.
Esse ano de 2024 a escola vai à Avenida com o enredo “Nosso Destino É Ser Onça”, dos carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora. O desfile vai propor uma reflexão sobre a simbologia da onça no cenário artístico-cultural brasileiro, tocando em temas como antropofagia e encantaria.
Hora de conhecer a história da Beija-Flor de Nilópolis
A Baixada Fluminense também é o berço de uma das escolas mais tradicionais do carnaval carioca. Fundada em 1948, em Nilópolis, a escola já consagrou 14 títulos.
A história da “Deusa da Passarela”, como a escola também é conhecida, começa no Natal de 1948, quando um grupo de amigos formado por Milton de Oliveira (Negão da Cuíca), Edson Vieira Rodrigues (Edinho do Ferro Velho), Helles Ferreira da Silva, Hamilton Floriano, José Fernandes da Silva e os irmãos Mário Silva e Walter da Silva resolveram forma o Bloco Associação Carnavalesca Beija-Flor.
Esse novo bloco, que depois se tornaria escola de samba, foi feito para suprir a extinção dos blocos Irineu Perna-de-Pau e dos Teixeiras. Nessa reunião, também foram escolhidos o nome, as cores, o símbolo e a madrinha da agremiação.
O bloco foi campeão municipal logo em 1949, seu primeiro ano de desfile, tendo sido tricampeão até 1953, quando passou a ser oficialmente uma escola de samba. Em 1954, participou dos desfiles do segundo grupo de carnaval carioca e já obteve o primeiro lugar da competição.
Após vários anos nas divisões inferiores, em 1973 a escola conquistou o vice-campeonato do segundo grupo com o enredo sobre educação e retornou à divisão principal.
A história da agremiação pode ser dividida em duas partes: antes e depois de Joãozinho Trista, que assumiu o cargo de diretor em 1976, com o enredo em homenagem ao jogo do bicho. Segundo boa parte da crítica, os desfiles assinados por ele são considerados antológicos, pois mesmo quando não vencia, provocava admiração nos espectadores.
Desfile de 1989 – Censurado
Naquele ano a escola conhecida pelo luxo de suas alas e alegorias surpreendeu o público com o enredo “Ratos e urubus, larguem a minha fantasia”, levando ao Sambódromo carros e alas repletos de lixo, além do Cristo Redentor mendigo.
Após ação judicial proposta pela Igreja Católica a imagem foi proibida pela Justiça e a alegoria passou o desfile coberta por um plástico e uma placa escrita “mesmo proibido, olhai por nós”. Naquele ano, a Beija-Flor ficou com o segundo lugar, mas Joãozinho foi considerado por algumas pessoas o campeão moral do desfile. Mesmo com a proibição, no meio do desfile das campeãs os integrantes arrancaram o plástico que cobria o Cristo levando o público ao delírio.
Beija Flor vence o campeonato com 269,9 pontos de 270 possíveis
Em 2015 a Beija-Flor encantou mais uma vez a Sapucaí com o enredo “Um griô conta a história: Um olhar sobre a África e o despontar da Guiné Equatorial. Caminhemos sobre a trilha de nossa felicidade”, que abordou a cultura e história da Guiné Equatorial. Nem mesmo a polêmica envolvendo notícias sobre o patrocínio dado pelo ditador do país africano retratado conseguiu apagar as forças da escola.
Uma escola multicampeã: 14° Título
A última grande conquista da Beija-Flor foi em 2018, a escola conquistou o seu 14.º título de campeã do carnaval carioca com o enredo “Monstro É Aquele que não Sabe Amar — os Filhos Abandonados da Pátria que os Pariu.”
O enredo da escola fez uma analogia a obra Frankenstein, que completou duzentos anos de lançamento em 2018, e as mazelas sociais do Brasil. A criatura histórica de Mary Shelley foi abandonada pelo seu criador, os problemas sociais brasileiros são frutos do abandono da população por parte dos governantes.
Esse ano a escola promete emocionar com um enredo sobre as nobrezas de Maceió, Nilópolis e Etiópia no enredo “Um delírio de Carnaval na Maceió de Rás Gonguila”. Um encontro mágico de personagens reais, mas que nunca se viram, guiados pela luz dos encantos e da ancestralidade, com as cores, ritmos e pisados dos foguetes das Alagoas.
Ansiosos?!
Isabelle Brenda é nascida e criada em Duque de Caxias. Formada em História pela UFRJ, pesquisa sobre História da Imprensa no Rio de Janeiro no século XX. Atualmente, trabalha como supervisora de pesquisa no IBGE.