Os 80 e suas lembranças

Por Jackeline Marins

“Meia-noite no meu quarto, ela vai subir… um abajur cor de carne, um lençol azul, cortinas de seda…”

Todo o resto está na mente?

Com certeza, está, se você viveu a adolescência nos anos 1980, porque essa foi a música que mais tocou no Brasil naquela década. Tempo de efervescência do pop rock Brasil e as baladas do fim de semana. E não era pouco variado, porque no cenário internacional também floresciam delícias… tanta música! Sem querer brigar com as lembranças de outras gerações, é claro!

Afinal, a batida do funk é sensacional!

Vou desafiar você! Faz a lista inesquecível da sua vida. E, tá tudo bem,  se a gente ainda ouve essa galera.

E as crianças? Kichute nos pés, ki-suco na goela (tinta pura, não sei como não intoxicava, risos), gravador gradiente vermelho, amarelo e azul para cantar e entrevistar os outros… E também o atari com seus joguinhos toscos… Eu amava! Era fera no river raid, no space invaders e no pac man. Muitos risos mais, saiba você.

Época do movimento Diretas Já, do primeiro emprego, da universidade… do jovem indígena Krenak no plenário do Congresso, dos movimentos sociais em atividade na elaboração da Constituição de 1988. Afinal, depois da cidadania em recesso, como falou José Murilo de Carvalho, voltamos a ter direitos. A Carta Magna de 1988 é a que ainda vigora no país. E, no ano seguinte, 1989, foram elaboradas as constituições estaduais.

No ano da Assembleia Constituinte do Estado do Rio de Janeiro, cheguei à Alerj. Agente de Segurança, grávida da primeira filha, para quem gostava de narrar os detalhes da arquitetura do Palácio Tiradentes, seus anjos, relógios e mosaicos. E começava a construir memórias da vida que se passava ali, entre colegas, trabalho, autoridades, o povo e a história.

Chamada por Ulysses Guimarães de Constituição Cidadã, porque a palavra estava na moda (José Murilo, de novo) e porque passou a garantir direitos de cidadania para os brasileiros, a primeira Constituição que não nasceu de um anteprojeto feito previamente.

Elaborada pelos deputados e senadores eleitos democraticamente, em 1986 para serem constituintes, a elaboração da Carta contou com as contribuições de cidadãos, associações e movimentos sociais, das Câmaras de Vereadores, das Assembleias Legislativas e Tribunais.

As sugestões foram discutidas pelo Congresso Nacional e os parlamentares as converteram em um anteprojeto muito extenso, com mais de 500 artigos, que recebeu 65.809 emendas. Trabalho de fôlego para reduzir o texto,  garantir direitos sem amarrar os caminhos para avanços necessários, conciliando visões de diferentes matizes políticos.

Mesmo fora da Assembleia Constituinte, deputados que têm poder constituinte reformador podem fazer alterações na constituição. Assim como os integrantes do Congresso Nacional podem fazê-lo em relação à Carta Federal.

O artigo 60 da Constituição Federal estabelece os pontos que não podem ser revogados ou alterados. São chamados, por isso, de cláusulas pétreas. Assim o é, porque a Assembleia Constituinte achou por bem retirar do poder constituinte reformador essa possibilidade, em razão da importância desses pontos para a vida nacional.

São cláusulas pétreas: a organização do Estado brasileiro em uma federação; o voto direto, secreto, universal  e periódico; a separação entre os Poderes do Estado e os direitos e garantias individuais.

Quanto ao processo legislativo, as alterações seguem um rito diferente dos projetos de lei.

As propostas de emendas constitucionais – PECs – precisam do apoiamento regimental de um terço dos parlamentares, ou seja de 24 deputados, para serem apresentadas. Podem, ainda, ser originárias de uma proposta do governador ou de mais da metade das Câmaras dos municípios de todo o Estado, contendo a assinatura da maioria dos membros de cada uma delas.

Depois de apresentadas, são publicadas, e remetidas para a Comissão de Emendas Constitucionais e Vetos, que, em primeira análise, deve se manifestar, em cinco dias, sobre a admissibilidade da matéria.

Por exemplo, se a PEC pretende alterar uma das cláusulas pétreas, não pode ser admitida. Assim, a primeira manifestação da comissão diz se a proposta pode ser admitida ou não, concluindo pela admissibilidade ou inadmissibilidade.

Se admitida, é remetida ao plenário e, ao término da apreciação, a PEC é devolvida à comissão para que abra prazo de cinco dias para recebimento de emendas, porque o §3º do artigo 192 do Regimento Interno, estabelece que apenas perante a comissão podem ser apresentadas emendas.

Esse prazo transcorre dentro dos dez dias de prazo para a comissão apresentar parecer quanto ao mérito da proposta e o apoiamento de 24 parlamentares também é necessário para a apresentação das emendas.

Dois dias após a publicação do parecer da Comissão de Emendas Constitucionais e Vetos sobre o mérito da proposta e das emendas, a PEC é incluída na Ordem do Dia de Plenário, e só é aprovada se obtiver voto favorável de três quintos dos  setenta deputados nos dois turnos de votação.

Em período de intervenção federal, estado de defesa ou estado de sítio, a Constituição não pode ser emendada. Além disso, o assunto de uma PEC rejeitada ou prejudicada não pode ser tema de nova proposta na mesma sessão legislativa. E, por exigir quórum qualificado, as votações sobre propostas de emendas constitucionais são nominais, para verificar o cumprimento da exigência dos três quintos de votos para sua aprovação.

Lembrando sempre que o Regimento Interno é o livro que contém as regras do jogo parlamentar. Para aqueles e aquelas que atuam nos parlamentos, conhecer seus regimentos é fundamental. Afinal, ninguém entraria em campo para jogar futebol sem saber as regras, não é mesmo?

Diferente do que acontece com as canções e nas artes em geral.

Há algumas regras talvez…  da ortografia para as letras, da harmonização entre a sintaxe da língua escrita e da melodia, em que, como ensina quem entende do assunto (nesse caso, Tércio Simon), “as fórmulas e barras de compasso são as referências básicas para identificar os sons acentuados na música”.

Para as técnicas de pintura e escultura… para os movimentos da dança ou do cinema. Talvez exista uma métrica musical para ordenar a criação, mas talvez seja mesmo como descrito na canção de João Nogueira e Paulo César Pinheiro, chamada Poder da Criação.

Seus versos, em melodia incrível, dizem que “é uma luz que chega de repente, com a rapidez de uma estrela cadente, que acende a mente e o coração”.

Ah! Ainda bem que se foram as cabeleiras, ombreiras e exageros de todo tipo, que também fizeram parte da década de 1980. E, hoje, menos é mais. Lema atualíssimo, que combina melhor com os novos tempos e com a preservação ambiental, tão necessária para o planeta que queremos para nosso futuro e o de nossos descendentes que já chegaram ou estão ainda por vir.

O que é muito bom lembrar, especialmente, na semana em que se comemora o Dia Mundial do Meio Ambiente, em 5 de junho, data criada em 1972, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente.

E, como nem só de música, foram feitos aqueles anos 80, para dar uma volta pela questão ambiental, o Ipea aponta a Lei nº 6.938, de 1981, que criou o Sistema Nacional do Meio Ambiente com princípios, diretrizes, instrumentos e atribuições da política ambiental, como uma grande contribuição da década.

Pra fechar, vamos de Beto Guedes e Ronaldo Bastos com os versos de 1981: “Terra, és o mais bonito dos planetas. Tão te maltratando por dinheiro, tu que és a nave, nossa irmã”.

Ô década boa! Risos aos montes.

Jackeline Marins é Mestre em Política Social, Especialista em Administração Pública, Pedagoga, Especialista do Legislativo colaboradora do BRAVA BAIXADA.

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