Na pele

Por Jackeline Marins

Esse é o mês das mulheres. Vamos falar da mulherada sem parar…

Crinolinas.

Sabe aquelas armações em formato de gaiola que as mulheres usavam embaixo das saias, no século XIX? Então, eram chamadas de crinolinas.

E por pior que possa parecer, foram um avanço em termos de vestuário feminino, porque as livravas de carregar o peso enorme das diversas camadas usadas para lhes assegurar um quadril avantajado, em contraste com as cinturinhas de espartilho. Mas provocavam um calor sem tamanho, que acabava por atrair insetos indesejados.

Os espartilhos as apertavam a ponto de tirar o ar, numa metáfora do aperto da própria vida, que as oprimia em relações de submissão, processos de silenciamento e exclusão de todas as atividades públicas.

Confinadas na vida e nos seus corpos, que deveriam corresponder aos padrões da época.

Nos tempos das crinolinas, mulheres morriam queimadas numa proporção de 3 eventos por semana, conforme publicação do New York Times de 1858. É que as saias adquiriam um tamanho avantajado e por vezes, ao chegarem perto das lareiras ou das velas usadas para iluminar as casas, os acidentes ocorriam. 

Tragédias. Acho que o ar lhes faltava pela força dos espartilhos, que lhes impedia a boa oxigenação, tolhendo a condição de avaliar bem o espaço que ocupava a vestimenta.

Ainda bem que essa fase já passou e dessas fatalidades estamos livres. Embora ainda sejamos compelidas a caber em corpos padrão, rostos artificialmente harmonizados, sem gorduras, que são lipoaspiradas para moldar a perfeição dos dias de hoje.

Taxa rosa.

Do original em inglês “pink tax”.

A taxa rosa é como se chama a prática do mercado de cobrar mais caro para produtos específicos para mulheres. Ocorre que não se trata de um imposto verdadeiro. Na realidade, são cobrados preços mais altos para produtos que sofrem pequenas adaptações ou simplesmente têm uma embalagem específica para chamar a atenção desse público.

A Agência Brasil, numa matéria de março de 2021, fez uma pesquisa com os preços de produtos para homens e seus equivalentes para mulheres em diversos setores e concluiu que, em média, a diferença de preço foi de 35% a mais nos produtos para o público feminino.

A discrepância emblemática ficou por conta de um analgésico que, por ter a palavra MULHER associada ao nome fantasia, teve seu custo elevado para mais de 190%. Ou seja, o mesmo remédio na versão específica para as dores decorrentes do ciclo menstrual custa o triplo.

Nessas horas, é bom pensar que a menopausa leva as cólicas menstruais. Um alívio…

Apesar desses custos específicos para mulheres ficarem, em média, 35% mais caros que para os similares destinados aos homens, de acordo com dados do IBGE, nós, mulheres, ganhamos, em média, salários 30% menores que os dos homens exercendo as mesmas funções.

É um exemplo inequívoco de que o mercado de consumo fomenta e lucra com a desigualdade de gênero. 

Não estamos falando de produtos supérfluos e que podem ser dispensados. Ao contrário, nós mulheres precisamos da grande maioria deles para atender alguma necessidade característica de gênero.

Violência obstétrica.

De acordo com a Agência Senado, no projeto de lei que tramita naquela casa legislativa, de autoria da senadora Leila Barros, “toda e qualquer conduta que seja direcionada à mulher durante o trabalho de parto, parto ou puerpério, praticada sem consentimento, desrespeitando sua autonomia ou feita em desacordo com procedimentos estabelecidos pelo Ministério da Saúde e que cause dor, dano ou sofrimento desnecessário” é uma violência obstétrica.

Casos isolados? Não. De acordo com a pesquisa “Nascer no Brasil”, 45% das mulheres entrevistadas declaram já ter sofrido algum tipo de violência obstétrica, seja no SUS ou na rede privada.

Além dos danos psicológicos, as lesões físicas provocadas comprometem a sexualidade dessas mulheres e a qualidade de vida que terão a partir do evento.

Estupros.

Subindo um pouco mais o tom, vejamos os dados dos estupros em nosso país.

De acordo com o Ipea (02/03/2023), o Brasil tem cerca de 822 mil estupros a cada ano. Uma estatística que leva ao número assombroso de duas de ocorrências por minuto e que abre uma ferida sem cura, produzindo danos inimagináveis para a vida dessas mulheres, jovens, adolescentes, meninas. 

Umas estavam nos hospitais, nos consultórios médicos. Outras estavam na proteção de seus lares. Há aquelas que estavam nos escritórios. E, também, as que festejavam nos bares ou na casa de amigos.

Sóbrias, bêbadas, vestidas, doentes, parindo… há ocorrências de todas as formas e tipos: nas casas, no trabalho, nas universidades, no transporte… esses dados confirmam o que já se diz há tempos: a culpa nunca é da vítima.

É por isso que se veem movimentos aguerridos de mulheres que gritam denunciando essas e outras violências. Mulheres que se unem pelo mundo todo em brados que ecoam como o me too; nenhuma a menos; mexeu com uma, mexeu com todas.

Pra retomar o fio, pensemos em termos comparativos: as crinolinas matavam ao menos 3 mulheres por semana. Enquanto isso, o feminicídio matou uma mulher a cada 6 horas, no Brasil de 2022, sem levar em conta a subnotificação ou omissão de casos, que sempre ocorre.

Desigualdade social de gênero, desigualdade profissional de gênero, desigualdade política de gênero. 

Violência doméstica, violência obstétrica, violência sexual, violência política de gênero, feminicídio. 

Perdeu o ar ao menos uma vez? Então, bora lá transformar esse mundo!

Jackeline Marins é Mestre em Política Social, Especialista em Administração Pública, Pedagoga, Especialista do Legislativo colaboradora do BRAVA BAIXADA.

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